silogismos da enxada
quem se importa com a aporia de meus segundos psicóticos
ou
com a fadiga de meus cílios saudosistas?
imaginar-se mortinho da cruz
com uma ostra em que eu assinei bêbado
ocultando minhas vergonhas
qual santo cortou sua língua e dela fez um banquete para os mendigos?
sentir-se mortinho da cruz
com uma maça-do-amor amordaçando meus dentes
percebi que o metrô é um estrangeiro no terceiro mundo quando descobri que lá mendigar é proibido
ver-se mortinho da cruz
black tie a là rigor mortis
sonho com policiais me revistando
nem sempre tenho medo
e nem sempre parece assédio sexual
ouvir-se mortinho da cruz
com gases e vermes ronronando em meu templo
não parir palavra com a boca por cinco dias
e cinco noites
não escrever palavra com os dedos
cheirar-se mortinho da cruz
formol & tabu
abraçar meus ossos abúlicos
como um bikhu num yabyum
degustar-se mortinho da cruz
inchado azedomargo
tatuar a palavra TALVEZ na testa
ruminar-se mortinho da cruz
sem talheres nem dentes nem garganta nem tripas
alguns policiais sonham comigo
seu medo fora do coldre
eu: um marco horizontal
saber-se mortinho da cruz
surfando na sesta ébria da inexistência
perscruto o teto frágil
me lembro que nunca transei sóbrio, enterro outra lágrima natimorta
o que é a vida senão uma sucessão de suicídios?
ray cruz
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