ocaso de vidas prematuras
17:55
Luzia engoliu outro comprimido seco. olhou a água balançando o copo por alguns segundos antes de regar o minicacto murcho
18:00
alguém bate na porta reclamando do mal cheiro que escapa pelas frestas.
24 horas e dois litros de Canção atrás
Luzia imprimiu um meme em uma folha A4 que fixou cuidadosamente na porta do banheiro com durex e cola quente.
não há mais como escrever um bilhete original e criativo. não quando este justifica um ato irrevogável. não nos dias atuais, em que nenhuma explicação parece autêntica ou diferente da canção clichê no rádio da sua avó.
13:00 há um mês atrás
"advinha quem completou o ensino médio?"
"grande coisa minha filha, eu to lavando bosta dos outros é pra meus filho tudo virar doutor."
"a senhora poderia pelo menos me parabenizar."
"quase que não passa de ano, só vive de namorico por ai e ainda quer prêmio por cumprir com sua obrigação?"
18:15
a janela do minúsculo quarto de hotel imita uma tela. a tela da televisão imita a janela e a tela do celular acende no fundo da lixeira.
11:00 há dez dias atrás.
"estou grávida."
"quem é o pai?" berrou Renato após cuspir o café frio em suas pernas.
"o idiota sentado na minha frente."
Renato olhou para os lados procurando outro réu antes de sussurrar que Luzia deveria procurar um açougue e jogar fora aquele monstrinho que ameaçava roubar sua vida.
18:23
Luzia sente a chave indigesta pinicar no estômago roncando. a única chave da única porta do pequeno cubículo onde se hospedaram uma semana antes.
19:00
ela termina de desossar as omoplatas. está consumado. acende um baseado com o capítulo 12 do apocalipse. joga o cacto murcho na privada.
12:00 após dois dias
ninguém acordou. as luzes continuaram acesas. a mãe de Luzia finalmente viu a filha na tv.
Ray Cruz